Não há coisa mais interessante que observar pessoas.
Elas estavam encostadas ao bar. Cabelos lisos, escovados no cabeleireiro, unhas vermelhas, peles macias, rostos porcelanados pelo pó-de-arroz, olhos marcados pelo kajal, lábios brilhantes feito cerejas, roupas pretas, para emagrecer, saltos muito altos e o mesmo olhar vazio de todas as outras bonecas de porcelana que se acomodavam à sua volta. O cabelos tingidos de loiro, as costas eretas para exibir o busto, o olhar incessantemente sensual, como se sofressem de um eterno apetite sexual. Elas não sorriem, movimentam os lábios na horizontal, não abrem a boca nem mostram os dentes, são comedidas, não por timidez, mas por falta de expressão. Olham para o recinto apertado e escuro. Percebem cada olhar masculino sobre suas curvas e retribuem o olhar com um outro, de esgelha e conseguem até fingir o rubor das bochechas, mas é blush.
Elas permanecem encostadas toda a noite no bar, conseguem bebidas de graça soltando gracinhas para os garçons, não dançam, se embriagam e permanecem com suas poses de divas mesmo quando os calos dos seus sapatos não as deixam mais ficar em pé. São todas assim e todas, quase que ao mesmo tempo, olham para o outro lado do bar. Alguma coisa chamou atenção e não foram os machos. Duas mulheres pequenas. Duas mulheres que parecem meninas, perdidas naquele lugar. Elas cantam todas as músicas, sabem todas as letras, as que não sabem inventam. O canudinho serve de microfone para aquele furor. Duas meninas que se destacam por serem muito felizes. A felicidade delas incomodava e destoava do recinto. Os homens também começam a estranhar, mas a estranheza logo se transforma em perplexidade e interesse. As bonecas de porcelana substituem os olhares vorazes por um questionamento: o que as faz serem tão felizes? de que tanto riem? por que não se preocupam em fazer caretas e rir alto demais? por que não se incomodam com os cabelos à chuva? Por que tiram os sapatos quando os calos doem? E não encontram resposta. Essas duas pessoas pararam o lugar escuro e apertado. Mesmo minúsculas eram peixes grandes demais para aquele aquário, eram peixes de mar, não de criatório. Eram peixes que sabiam sorrir com a boca e com os olhos e com todo o corpo, peixes que não precisavam de motivos para sorrir. As duas pessoas peculiares desta história não faziam gracinhas para o garçon para ganhar bebidas, mas para pedir os morangos vermelhos que eles colocariam nos drinks, e saltavam e vibravam com as músicas como se fossem crianças.
CRÉDITOS
A nós, Janaína, os peixinhos desta história.
Às outras mulheres que também são peixes de mar.
domingo, 1 de junho de 2008
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2 comentários:
E esse lugar jamais será o mesmo depois que esses peixes passaram por lá...
Peixes felizes, sorridentes, espontâneos em sua ingenuidade,que ainda tentaram nesta mesma noite entender o motivo de algum peixe que estava em um aquário onde não sabia nadar, e eu até tentei ensinar...
Preciso parar de me perguntar o motivo do resto não ser como somos, porque cada vez que faço isso, pareço nadar contra a correnteza e isso me atrasa bastante.
Que nadem cada um em sua própria velocidade, e se, um dia, tivermos que nadar juntos, que seja só para dividir a experiência de novos lugares e de uma água mais clara e doce, então faremos...
Acabei de montar um protesto. As placas dizem: EXIGIMOS NOVOS POSTS!
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